quinta-feira, 14 de abril de 2011

A INTERVENÇÃO DO PODER PÚBLICO NO DOMÍNIO ECONÔMICO

                                       A intervenção do poder público no domínio econômico deve ser compreendido dentro de um contexto de transformações políticas, sociais e econômicos que determinam o novo perfil do Estado.
De fato, o advento do chamado Estado Social (Welfare state) representou um aumento substancial das atividades estatais, com uma significativa expansão das atividades legislativas, executivas e judiciárias, de modo a efetivar uma nova geração de direitos fundamentais consubstanciados nos direitos sociais, culturais e econômicos.
As aspirações por uma sociedade mais justa e em que o princípio da igualdade fosse materialmente assegurado serviram de impulso para o surgimento do Estado social no séc. XX.
À época as ideais propugnadas pelo liberalismo consolidada pela revolução francesa, representou a prevalência e interesses da burguesia em detrimento do proletariado.
Por outro lado, caracterizado pelo individualismo e pela não intervenção do Estado na economia, o liberalismo pregava a igualdade de todos perante a lei, sendo que tal igualdade realizava-se apenas na teoria, no plano formal, distanciando-se do que ocorria na prática.
A tudo isso, entretanto, o Estado assistia sem interferir, afinal, prevalecia o princípio da auto – regulação das relações econômicas, o que só a aprofundar ainda mais as contradições da sociedade.
Foram essas incoerências do modelo liberal, notadamente o caráter absenteísta do Estado, que passaram a exigir uma maior intervenção nas relações econômicas e sociais, com o fito de amenizar as desigualdades e exploração de uma classe por outra, anunciando, deste modo a necessidade de se repensar o capitalismo e a profunda separação entre capital e trabalho.
As pressões sociais contra as ineficiências do liberalismo, aliadas as correntes que questionavam a situação vigente, em especial a ideologia maxista, marcaram o advento do Estado social, de um novo momento no papel do Estado.
E estado social caracterizou-se, sobretudo, por uma maior intervenção estatal nas relações econômicas e sociais, ou seja, ao absenteísmo sucedeu o intervencionismo.
Fonseca (2001, cap. IV, p. 224) entende que o fenômeno da concentração do poder econômico nas mãos de uns poucos veio a trazer a necessidade de o Estado intervir para sanar a crise do liberalismo econômico, salvando a liberdade de iniciativa.
Ressalte-se que o Estado não interveio para coibir a liberdade econômica das empresas, mas para garanti-la mais concreta e efetiva. A primeira manifestação constitucional dessa tendência vamos encontrar na Constituição do México de 1917, que, no seu art. 27, confere à Nação o direito de “impor à propriedade privada as regras que ditem o interesse público”. E no art. 28, estabelece a proteção contra o monopólio e o combate à concentração ou açambarcamento.
Já a Constituição de Weimar veio estabelecer que a “organização da vida econômica deverá realizar os princípios da justiça”.
A constituição brasileira de 1934, aderindo ao discurso manifestador das idéias imperante, recepcionou o dogma, admitindo o ingresso do Estado para atuar no mercado, gerando uma nova ordem disciplinada no capítulo da ordem econômica e social.
A Carta de 1937 foi a primeira a trazer em seu texto dispositivo inerente “a intervenção do Estado no domínio econômico”.
Igualmente, a Constituição de 1946 torna explícitos os parâmetros fundamentais que balizam a intervenção do Estado no domínio econômico em seus artigos, 145 e 146. Também a constituição de 1967, cuidou da intervenção do Estado no domínio econômico, em seu art. 157.
A Constituição de 1988, por seu turno, trouxe outra fundamentação ideológica para essa atuação do Estado no domínio econômico. A Carta, dita cidadão, surgiu sob o influxo de direcionamentos modernos, rompendo com a tendência francamente intervencionista da Constituição de 1967 – 1969.
O art. 174 de nossa atual Carta Magna se coloca como um marco divisório, contrapondo-se ao art. 163 da Constituição de 1967 – 1969.
Da leitura do art. 173 de nossa atual Carta Política, deduz-se que a exploração direta da atividade econômica pelo Estado constitui-se exceção. A regra é a de que o Estado não deve atuar diretamente no domínio econômico. A exceção está restrita a fatores determinantes: imperativos da segurança nacional e relevante interesse coletivo.
Demonstrado, pois, os fundamentos históricos explicativos da intervenção do Estado no domínio econômico, impende agora ser explicado as razões que determinaram esse intervencionismo.
A primeira razão da intervenção do Estado se situa no fracasso do mercado. A intervenção teve por objeto garantir a livre competição no mercado dando-lhe consistência.
A segunda razão consiste nos critérios de eqüidade da distribuição. Aqui o Estado assume o compromisso de atuar na justiça distribuitiva, buscando uma justa distribuição de renda.
Uma terceira razão, a que mais crítica tem sofrido e servido de repulsa à crescente atuação do Estado no setor econômico, é a que “consiste na obtenção rápida de determinados objetivos de política econômica em luta contra o ciclo da econômica”. O estado aqui passa a exercer a função empresarial com o fim de conseguir mais prontamente metas que só demoradamente seriam alcançadas pelos particulares.
A intervenção do Estado no domínio econômico pode ocorrer de forma direta e de forma indireta. No primeiro caso, assume a forma de empresas públicas, nome genérico que compreende no sistema jurídico Pátrio as empresas públicas propriamente ditas e as sociedades de economia mista, conforme o estatuído no art. 173, §§ 1º, 2º e 3º da CF. No segundo caso, atuação indireta, o Estado o faz através de normas, que têm como finalidade fiscalizar, incentivar ou planejar, conforme estabelece o art. 174 da CR.
Através da atuação direta o Estado passa aa atuar como empresário, comprometendo-se com a atividade produtiva, quer sob a forma de empresa pública quer sob a de sociedade de economia mista. Sob estas duas formas pode ele atuar em regime concorrencial, em que se equipara com as empresas privadas, ou em regime monopolístico. Como exemplo do primeiro do primeiro caso (regime concorrencial) pode ser apontado a Caixa Econômica Federal – empresa pública federal -, e o Banco do Brasil – sociedade de economia mista -, que atuam em regime de concorrência com as demais instituições bancárias do País. Como exemplos do segundo caso (regime monopolístico), pode ser citados a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos – empresa pública federal -, e a Petróleo Brasileiro S. A – Petrobrás – (sociedade de economia mista). O monopólio da primeira está consagrado no art. 21, X, e o da segunda no art. 177, I, II e III da Constituição Federal.
A intervenção direta pode ser feita ainda por outro caminho: o Estado assume a gestão de empresa privada, passando a dirigi-la quando interesses da ordem social o exijam. Exemplo dessa forma ocorre nos termos da Lei 6.024 de 13/03/1974, quando o Banco Central do Brasil (BACEN) assume a direção de instituições financeiras privadas e públicas federais, com o intuito de normalizar o seu funcionamento ou, se isto for inviável, decretar e realizar a sua liquidação extrajudicial.
A organização da intervenção direta do Estado no domínio econômico encontra substrato jurídico legal no Dec. Lei 200/67, e na legislação subseqüente, que modificou substancialmente.
A verdade é que não se pode negar que o novo papel do Estado na atividade econômica leva a um enfoque de afastamento do intervencionismo estatal.
Em nosso País, a Constituição de 1988 mudou fundamentalmente o direcionamento jurídico da posição do Estado no campo da atividade econômica.
O art. 170 da CF, ao traçar os parâmetros da Ordem Jurídico – econômica Brasileira, privilegiou o fundamento da liberdade de iniciativa, que, pela sua própria conceituação doutrinária e legal, limita a intervenção do Estado no domínio econômico.
E é esse justamente o contexto normativo do Título VII da Constituição Federal. Assim é que o art. 173 da Carta Magna estabelece:
“Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta da atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei”.
Vê-se, pois, que o Constituinte de 1988 optou por mudar completamente o sistema anterior, vigente ao tempo da Carta de 1967, quando a atividade estatal era supletiva da iniciativa privada, justificando-se àquela época, de forma ampla, a exploração direta, pelo Estado, da atividade econômica.
Agora, após o texto constitucional de 1988, “a exploração direta da atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou o relevante interesse coletivo”, exigindo-se ainda que os imperativos e o relevante interesse sejam definidos em lei.
Por fim é de se notar que nos termos do art. 174 da Constituição Federal, o papel do Estado dentro do contexto na Nova Ordem Jurídico - Econômica se dará como agente normativo e regulador da atividade econômica. Dentro dessa sua nova configuração, terá ele, precipuamente, três funções: fiscalizar, incentivar e planejar.
De lembrar ainda que, os contornos dessa Nova Ordem Jurídico – Econômica levam a conclusão de que a partir da promulgação da Constituição de 1988, todas as participações acionárias do Estado se tornaram inconstitucionais, a exigir uma pronta tomada de posição legislativa e administrativa no sentido de dar cumprimento ao novo imperativo constitucional.

JOSIVALDO FÉLIX DE OLIVEIRA
Juiz de Direito – Prof.º Univ. Especialista em D. Civil

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